CONCORRÊNCIA DESLEAL NO SETOR FUNERÁRIO

“A concorrência desleal se trata de uma prática ilícita, com técnicas e meios de trabalho ilegais e abusivos no intuito de angariar clientela de uma forma que extrapola os limites da livre iniciativa e à livre concorrência.”

Atualmente, uma expressão que está em alta é “concorrência desleal”. E não é para menos, pois o número de processos judiciais envolvendo o tema tem crescido muito nos últimos anos. A concorrência é algo saudável, pois estimula a melhoria nas atividades desenvolvidas pelas empresas, resultando em benefícios tanto para o consumidor como também para as próprias empresas.

A competição impulsiona às empresas a buscar aprimoramento e diferenciais que lhes dêem vantagens perante os concorrentes, como conhecimentos técnicos específicos, novas tecnologias, inovações, maior eficiência em marketing, melhoria no atendimento ao cliente, melhoria dos produtos e serviços, entre outros pontos.

Mas há aquelas empresas ou profissionais que praticam uma forma não saudável de concorrência, a concorrência desleal, que é uma prática ilícita, com técnicas e meios de trabalho ilegais e abusivos, no intuito de angariar clientela de uma forma que extrapola os limites da livre iniciativa e à livre concorrência, já que as práticas utilizadas se baseiam em meios imorais e antiéticos.

A Constituição Federal, no art. 170 estabelece que “a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existências dignas, conforme os ditames da justiça social”. No entanto, por mais liberdade que as pessoas possuam para desenvolver livremente suas atividades, a livre concorrência não é totalmente irrestrita, já que encontra o seu limite nos direitos de outros concorrentes.

A concorrência desleal é uma prática apontada na Lei Federal nº 9.279, de 14 de maio de 1.996, na norma conhecida como Lei da Propriedade Industrial. Apesar de estar contida numa norma que trata de um tema específico, a concorrência desleal prevista se aplica a todas as atividades de mercado.

No art. 195 da referida lei, constam os atos e atividades que são consideradas como “crimes” de concorrência desleal, sendo que a infração a qualquer dos dispositivos previstos no art. 195 poderá ocasionar uma condenação de 03 (três) meses a 01 (um) ano de detenção ou multa. Os crimes previstos no art. 195 são:

Art. 195. Comete crime de concorrência desleal quem:
I – publica, por qualquer meio, falsa afirmação, em detrimento de concorrente, com o fim de obter vantagem;
II – presta ou divulga, acerca de concorrente, falsa informação, com o fim de obter vantagem;
III – emprega meio fraudulento, para desviar, em proveito próprio ou alheio, clientela de outrem;
IV – usa expressão ou sinal de propaganda alheios, ou os imita, de modo a criar confusão entre os produtos ou estabelecimentos;
V – usa, indevidamente, nome comercial, título de estabelecimento ou insígnia alheios ou vende, expõe ou oferece à venda ou tem em estoque produto com essas referências;
VI – substitui, pelo seu próprio nome ou razão social, em produto de outrem, o nome ou razão social deste, sem o seu consentimento;
VII – atribui-se, como meio de propaganda, recompensa ou distinção que não obteve;
VIII – vende ou expõe ou oferece à venda, em recipiente ou invólucro de outrem, produto adulterado ou falsificado, ou dele se utiliza para negociar com produto da mesma espécie, embora não adulterado ou falsificado, se o fato não constitui crime mais grave;
IX – dá ou promete dinheiro ou outra utilidade a empregado de concorrente, para que o empregado, faltando ao dever do emprego, lhe proporcione vantagem;
X – recebe dinheiro ou outra utilidade, ou aceita promessa de paga ou recompensa, para, faltando ao dever de empregado, proporcionar vantagem a concorrente do empregador;
XI – divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos, informações ou dados confidenciais, utilizáveis na indústria, comércio ou prestação de serviços, excluídos aqueles que sejam de conhecimento público ou que sejam evidentes para um técnico no assunto, a que teve acesso mediante relação contratual ou empregatícia, mesmo após o término do contrato;
XII – divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos ou informações a que se refere o inciso anterior, obtidos por meios ilícitos ou a que teve acesso mediante fraude; ou
XIII – vende, expõe ou oferece à venda produto, declarando ser objeto de patente depositada, ou concedida, ou de desenho industrial registrado, que não o seja, ou menciona-o, em anúncio ou papel comercial, como depositado ou patenteado, ou registrado, sem o ser;
XIV – divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de resultados de testes ou outros dados não divulgados, cuja elaboração envolva esforço considerável e que tenham sido apresentados a entidades governamentais como condição para aprovar a comercialização de produtos.

Com base nos incisos do art. 195, podemos reconhecer algumas situações corriqueiras que ocorrem nas empresas do setor funerário, como por exemplo:

a) Funcionário sai de uma empresa e se vincula a outra empresa concorrente, e fornece para a nova empresa a listagem de clientes da empresa anterior. Essa é uma prática comum, onde além da concorrência desleal, fere-se também a nova Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), pois os dados dos clientes são de responsabilidade da empresa anterior, e jamais o funcionário poderia se apossar de tais dados.
b) Quando uma empresa utiliza cores, nome e outras características que geram confusão com sua concorrente, é possível caracterizar uma infração aos incisos III, IV e V do art. 195. Exemplo: uma empresa se chama Pax Cristo Rei, utiliza cores vermelhas e tem como símbolo um crucifixo vermelho. A concorrente passa a utilizar o nome Pax Astro Rei, utiliza a mesma cor vermelha e também um crucifixo vermelho (Nomes meramente ilustrativos).
c) Algumas Associações e Sindicatos emitem certificados às empresas associadas indicando que estão adequadas às condições previstas na Lei Federal nº 13.261/2016 (Regulamento dos Planos Funerários). Se uma empresa que não possui tal certificação informar a seus clientes através de publicidade ou qualquer outro meio que se trata de uma empresa certificada, sem que realmente seja, estará infringindo o contido no inciso VII do art. 195.

Esses são alguns exemplos que ocorrem no dia a dia das empresas que podem ser considerados concorrência desleal. Além da penalidade já citada, a empresa prejudicada pode reaver perdas, danos e demais prejuízos causados pela concorrente desleal, inclusive de atos não previstos naquela lei e que possa vir a ser configurado como concorrência desleal.

Por exemplo, se configurado que um ex-funcionário se apropriou dos dados de clientes, e fez com que 100 rescindissem os contratos e mudasse para a empresa concorrente, além da empresa prejudicada poder requerer todos os valores que deixou de receber desde que os clientes migraram de uma empresa para outra, essa empresa também pode pleitear danos morais da concorrente e também do funcionário que praticou o ato lesivo.

O processo judicial envolvendo concorrência desleal é complexo, pois necessita de profissionais com profundo conhecimento da matéria, além de uma instrução probatória consistente. Um ponto importante é a associação das práticas ilícitas também à infração da Lei Geral de Proteção de Dados.

Os crimes citados nos incisos XI e XII do art. 195, se referem a obtenção de informações confidenciais. Os dados de clientes das empresas são dados confidenciais e atualmente protegidos pela LGPD. Os dados dos clientes são de responsabilidade da empresa e quando um funcionário tem acesso a esses dados sem a autorização da empresa e os transfere a um terceiro, forma-se uma corrente de infratores, sendo a empresa cujos dados foram extraídos a responsável pelos dados, o funcionário o usurpador e a empresa para a qual ele transferirá os dados a receptora.

As multas para esse tipo de prática, previstas na LGPD, iniciam no valor mínimo de 2% (dois por cento) do faturamento da empresa, até o limite de R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de Reais) por infração. Lembrando que cada dado de cliente pode ser configurado como uma infração. Também poderá sofrer multa diária e publicização da infração, bloqueio dos dados pessoais envolvidos, suspensão parcial, por até seis meses, do banco de dados envolvido, proibição parcial ou total do exercício de atividades relacionadas a tratamento de dados.

É válido alertar que os efeitos da publicização da penalidade e do “vazamento” dos dados dos clientes pode ser extremamente negativo e prejudicial para a empresa. Portanto, além das penas decorrentes da concorrência desleal, a empresa ainda está sujeita às penalidades da LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados.

A prática da concorrência desleal no setor funerário ocorre há muitos anos, sendo combatida por Associações e Sindicatos. Mas infelizmente, ainda é uma prática comum. Cabe às instituições, a cada empresa e empresários o fortalecimento da moral no setor funerário, visando pôr fim a toda e qualquer prática de concorrência desleal, propiciando um ambiente de mercado saudável, competitivo e que visa o crescimento ao invés do detrimento do setor.

Artigo assinado pelo Dr. Anderson Adão e publicado originalmente
na Revista Funerária em Foco, ed. 19.

1 Comment

  1. Ozeias Bernardo de Andrade

    Material muito interessante.
    Digo mais, também temos concorrência desleal nos Cursos de Tanatopraxia. Um cidadão por aí levando enganação para alguns desenformados e cobrando de R$ 1.000,00 a R$ 900,00 reais por pessoa. E isso somente para prejudicar os professores e instrutores gabaritados.

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